A governança pública tem ganhado espaço e destaque para a Administração Pública contemporânea, especialmente diante da crescente demanda por serviços públicos mais eficientes, transparentes e alinhados às necessidades sociais.
Não se trata de uma simples questão gerencial ou de uma mera “moda” no contexto do direito público atual, mas de um modelo que contempla princípios e práticas diretamente vinculados aos fundamentos jurídicos que regem a gestão pública.
Desse modo, os aspectos jurídicos da governança pública destacam a sua relevância como instrumento que deve ser compreendido e implementado por gestores públicos/detentores de mandatos eletivos e a alta administração, a exemplos de prefeitos e secretários municipais.
A pedra angular e ponto de partida para a análise da governança pública é, por certo, o artigo 37 da Constituição Federal, que estabelece os princípios da Administração Pública: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Esses princípios são a base sobre a qual se assenta qualquer iniciativa pública (ou deveria), ao passo que não seria diferente ao tratar de governança, uma vez que garantem que os atos administrativos sejam realizados com integridade e em conformidade com o interesse público.
A governança pública, nesse contexto, surge como um complemento operacional a esses princípios, ao buscar estruturar mecanismos que promovam maior participaçãoe eficácia na gestão dos recursos públicos.
Governança pública, em apertada síntese, pode ser compreendida como o conjunto de processos, estruturas e práticas adotadas pela Administração Pública para a tomada de decisões, execução de políticas públicas e prestação de serviços, de modo que este conceito está diretamente ligado à ideia de governabilidade e, portanto, à legitimidade política e institucional dos gestores.
No Brasil, o Decreto Federal nº 9.203/2017 destaca a governança na Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, e apresenta elementos essenciais que podem ser expandidos para toda a gestão pública: LIDERANÇA, ESTRATÉGIA E CONTROLE.
No âmbito municipal, guardadas as devidas proporções, esses pilares merecem ser compreendidos como fundamentais para que a gestão pública alcance seus objetivos com eficiência, transparência e responsabilidade. Para além disso, deve haver verdadeira mudança cultural na rotina administrativa, sobretudo nos pequenos municípios.
O primeiro pilar, a liderança, exige que os gestores públicos compreendam sua posição não apenas como administradores de recursos, mas como agentes de transformação social.
A liderança na governança pública requer conhecimento técnico, habilidade política e compromisso ético, elementos indispensáveis para conduzir a máquina pública em direção a resultados concretos.
Para tanto, a seleção de equipes qualificadas e/ou o investimento em capacitação contínua são essenciais.
O segundo pilar, a estratégia, remete ao planejamento e à definição de prioridades.
O gestor público deve basear suas ações em instrumentos de planejamento, como o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, a Lei Orçamentária Anual e o Plano de Contratações Anual, garantindo a articulação entre recursos disponíveis e metas a serem alcançadas, de acordo com as necessidades locais e a disponibilidade de recursos e a estimativa de arrecadação.
E mais, o planejamento estratégico deve ser integrado com os objetivos de desenvolvimento sustentável, em conformidade com os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil.
Assim, a governança pública torna-se um mecanismo para alinhar os recursos administrativos e financeiros às reais demandas da sociedade, promovendo o uso racional e responsável dos recursos públicos, evitando desperdícios por falhas ou planejamento deficiente.
O terceiro pilar, o controle, é indispensável para garantir que as ações planejadas sejam executadas com eficiência e dentro da legalidade.
Nesse contexto, controle interno e externo desempenham papéis complementares. A governança pública, todavia, vai além do controle tradicional, ao incluir instrumentos como a transparência ativa, a participação social e a utilização de ferramentas inovadoras, que ampliam a fiscalização e promovem maior responsabilidade.
Além disso, a governança pública está diretamente relacionada aos conceitos de integridade e conformidade, que têm sido objeto de normatização crescente no Brasil.
O Decreto nº 11.129/2022, que regulamenta a Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), reforça a importância da adoção de programas de integridade na Administração Pública, que visam prevenir desvios de conduta e assegurar que as práticas de gestão sejam conduzidas de forma ética.
Ademais, a governança pública, quando aplicada de forma eficiente, possibilita a modernização da Administração Pública, especialmente com a adoção de tecnologias. Ferramentas de gestão eletrônica, como sistemas integrados de planejamento e orçamento, plataformas de gestão de contratos, instrumentos que potencializem a fiscalização, aplicativos de serviços públicos, entre outros instrumentos, tornam a gestão mais ágil e acessível.
Essas inovações são sustentadas por marcos legais como a Lei nº 14.133/2021, que regula as licitações e contratos administrativos, ao estabelecer normas para o planejamento, a transparência e a eficiência na gestão de recursos.
Por fim, a implementação de práticas de governança pública exige uma mudança cultural e institucional.
Os gestores públicos e mandatários precisam compreender que a eficiência na Administração Pública não se limita à redução de custos ou à aceleração de processos.
A verdadeira eficiência reside na capacidade de entregar serviços públicos de qualidade, que atendam às necessidades da população e promovam o bem-estar coletivo. Isso só é possível por meio de uma governança pública sólida, fundamentada em princípios e alinhada às melhores práticas de gestão.
A governança pública deve ser encarada não como um conceito abstrato e teórico, mas como um instrumento concreto e indispensável para o fortalecimento da Administração Pública, de modo que sua implementação requer comprometimento, planejamento estratégico e liderança ética, sendo um caminho seguro para alcançar maior eficiência na transparência na gestão pública.
Henrique Mota, é advogado, especialista em Direito Administrativo, Direito Público e Gestão Pública.